É preciso ter cuidado para que a caricatura que os intelectuais reacionários constroem, não contagie o trabalho dos militantes da cultura. Trata-se daquela imagem equivocada em que pensadores e artistas de esquerda estariam preocupados em valorizar somente obras de arte que apresentam o tema das lutas da classe trabalhadora. Que fique registrado: quem padroniza, avilta, reprime e reproduz o mais do mesmo em matéria de arte, é a indústria cultural. O marxismo possui uma visão distinta do empobrecimento espiritual imposto sobre a percepção das massas.
Obviamente por razões políticas, a crítica marxista tende a privilegiar obras e artistas que permitem compreender as contradições sociais de uma época. Isto nem sempre significa valorizar trabalhos de artistas e escritores comunistas. O caso do escritor Balzac é sempre muito oportuno: Marx e Engels consideravam o realismo se Balzac, autor politicamente conservador, como sendo da maior importância para compreender a sociedade francesa do período. A crítica marxista analisa a arte como um todo e tende naturalmente a valorizar propostas artísticas que apontem para a emancipação humana(portanto obras de um acentuado caráter anticapitalista).
Obras de arte contribuem com a crítica e a denúncia da classe dominante, de muitas formas. Não é verdade que somente poemas, romances, pinturas, filmes e peças de teatro que abordem o sofrimento do proletariado e suas lutas, que são revolucionárias. Mesmo sem pronunciar a palavra socialismo, um poeta pode contribuir muito mais com a luta socialista do que poetas tagarelas que vivem falando em ideias socialistas.
segunda-feira, 28 de agosto de 2017
segunda-feira, 21 de agosto de 2017
Boletim Lanterna. Ano 07. Edição 74
REALIZAMOS POR MEIO DESTE BLOG A CAMPANHA POR UMA LITERATURA REVOLUCIONÁRIA. Existem razões históricas para isto: a extrema direita e os conservadores como um todo procuram, nos campos nacional e internacional, intimidar as formas de crítica e resistência anticapitalista. Acreditamos que a literatura e a arte de um modo geral, são vitais para que a classe trabalhadora adquira consciência política. Não se trata da submissão da arte a um determinado órgão de poder. Não se trata de defender um único modelo estético. Não se trata de criar obras de arte que coloquem o trabalhador numa posição passiva. O que defendemos é que a independência e a pesquisa estética, são pressupostos para que os trabalhadores criem uma literatura de combate. Nosso desafio é contribuir para que a palavra escrita seja entendida como ferramenta libertadora: devemos contribuir com a formação de leitores trabalhadores. Devemos fazer com que a literatura faça parte do cotidiano do proletariado. Escrever é lutar.
domingo, 6 de agosto de 2017
Boletim Lanterna. Ano 07. Edição 73
Apresentamos Relato de mercado, de Geraldo Vermelhão.
" Os mercados municipais espalhados pelas cidades do Brasil, são espaços de vitalidade cultural. Nestes locais encontramos ar cores, os relatos, as brincadeiras e a vida popular pulsando sem olhares gelados, abuso imperialista e gente fabricada nas fotocopiadoras da cultura burguesa. Lá no mercado a rapadura é palpável, a cachaça engasga o gato e as vassouras limpam as falas mecânicas da educação colonizada que as massas recebem. Ninguém aqui é besta para afirmar que se trata de um território sem alienação, sem tristezas, sem dores. Mas diferentemente de muitos espaços, encontramos a vida sem enfeites padronizados.
A água jogada sobre as verduras desce e requebra pelo paralelepípedo até berrar no ralo. Um galinho garnizé está sendo vendido para dois meninos descalços. Perto do açougue, um velho fuma seu cigarro de corda: seus olhos comidos pela catarata, sonham modas de viola que foram sugadas pelos anos do mercado. Por entre os corredores garotos famintos perambulam, dando licença para homens que carregam pesadas caixas contendo bananas e jabuticabas. Uma jabuticaba rolou para fora da caixa: um menino viu, correu para pegar, mas ela rolou escadaria abaixo. O mesmo menino olha o cachorro que mastiga tristemente um pedaço de pastel de carne que alguém deixou cair. O cachorro teve mais sorte.
No boteco do mercado, homens cansados e malandros que fazem samba com caixinhas de fósforo, conversam sobre futebol. Duas moças acompanham nos pés e nos quadris o samba que três rapazes fazem próximo ao balcão. Um cheiro de pimenta definia os olhos cheios de sexo. Abaixo da prateleira, em que repousam as garrafas de cachaça com antigos rótulos misteriosos, um homem inconformado exclama:
- Já carreguei laranja, já carreguei café, já carreguei cana e não tenho como pagar o ônibus. Já carreguei de tudo nos ombros mas num tem nada para me carregar!
Um peixe embrulhado é entregue a uma senhora que tirou o dinheiro de um bolsa de couro muito antiga. O cheiro do peixe mistura-se com o cheiro de pedras perfumadas. O peixe fedia menos do que a paisagem. Seu olho parado, seu olho morto, congelava aquela tarde em que um jornal atirado ao vendo informava o alto número de desempregados no país. "
Gerado Vermelhão
" Os mercados municipais espalhados pelas cidades do Brasil, são espaços de vitalidade cultural. Nestes locais encontramos ar cores, os relatos, as brincadeiras e a vida popular pulsando sem olhares gelados, abuso imperialista e gente fabricada nas fotocopiadoras da cultura burguesa. Lá no mercado a rapadura é palpável, a cachaça engasga o gato e as vassouras limpam as falas mecânicas da educação colonizada que as massas recebem. Ninguém aqui é besta para afirmar que se trata de um território sem alienação, sem tristezas, sem dores. Mas diferentemente de muitos espaços, encontramos a vida sem enfeites padronizados.
A água jogada sobre as verduras desce e requebra pelo paralelepípedo até berrar no ralo. Um galinho garnizé está sendo vendido para dois meninos descalços. Perto do açougue, um velho fuma seu cigarro de corda: seus olhos comidos pela catarata, sonham modas de viola que foram sugadas pelos anos do mercado. Por entre os corredores garotos famintos perambulam, dando licença para homens que carregam pesadas caixas contendo bananas e jabuticabas. Uma jabuticaba rolou para fora da caixa: um menino viu, correu para pegar, mas ela rolou escadaria abaixo. O mesmo menino olha o cachorro que mastiga tristemente um pedaço de pastel de carne que alguém deixou cair. O cachorro teve mais sorte.
No boteco do mercado, homens cansados e malandros que fazem samba com caixinhas de fósforo, conversam sobre futebol. Duas moças acompanham nos pés e nos quadris o samba que três rapazes fazem próximo ao balcão. Um cheiro de pimenta definia os olhos cheios de sexo. Abaixo da prateleira, em que repousam as garrafas de cachaça com antigos rótulos misteriosos, um homem inconformado exclama:
- Já carreguei laranja, já carreguei café, já carreguei cana e não tenho como pagar o ônibus. Já carreguei de tudo nos ombros mas num tem nada para me carregar!
Um peixe embrulhado é entregue a uma senhora que tirou o dinheiro de um bolsa de couro muito antiga. O cheiro do peixe mistura-se com o cheiro de pedras perfumadas. O peixe fedia menos do que a paisagem. Seu olho parado, seu olho morto, congelava aquela tarde em que um jornal atirado ao vendo informava o alto número de desempregados no país. "
Gerado Vermelhão
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