domingo, 18 de setembro de 2016

Boletim Lanterna. Ano 06. Edição 36

Nem sempre uma obra de arte que tem por tema o socialismo ou as lutas dos trabalhadores é revolucionária. Isto pode parecer obvio mas não é: o desconhecimento das questões estéticas pode adestrar a percepção da própria militância de esquerda com obras de arte infestadas de clichês, pautadas no melodrama, mergulhadas enfim nas estruturas de linguagem disseminadas pelo imperialismo, pelo que existe de pior na cultura de massa. Já discutimos anteriormente que o Realismo Socialista foi a experiência histórica que dissociou arte e revolução; aliás, por falar em jdanovismo, fica registrado aqui a divulgação da próxima edição do nosso ciclo de filmes Realismo Socialista, que ocorrerá no Museu da Imagem e do Som da cidade de Campinas: dia 24/09, às 16 h , será exibido o filme soviético Os Tratoristas(1939), de Ivan Pyryev. Mas além do jdanovismo, encontramos na indústria cultural um legado estético que fixa um patrimônio emocional reacionário nas massas(e nem sempre os socialistas estão imunes a isso).
 No tocante ao tema da indústria cultural, fazemos sérias reservas quanto ao diagnostico pessimista do filósofo Adorno. De fato, ele mostrou a maneira como a cultura no capitalismo avançado tornou-se um prolongamento do trabalho alienado: o elogio da rotina realizado por filmes, músicas, novelas e outros produtos, revela que a arte oculta os antagonismos sociais e torna-se um fator de integração, de conformismo. Porém, se a alienação é o que impera na indústria cultural, não podemos cair no pessimismo que toma como inevitável a neutralização das obras de arte que contestam a ordem vigente. Como já tivemos a oportunidade de dizer antes, é preciso contextualizar a produção artística de massa de acordo com os meios de produção culturais controlados pela classe dominante. Neste sentido, temos vários pontos de contato com Walter Benjamin: este pensador percebeu que a aproximação da obra de arte com as massas, destruiu séculos de abismos culturais e de elitismo artístico. Portanto, o nó da questão está em situar a arte dentro da luta de classes: se a indústria cultural age ideologicamente para sedimentar o sistema, cabe aos revolucionários criarem formas de resistência de acordo com seus próprios aparelhos de produção artística(esta é uma das várias lições de Benjamin).
  A criação artística dentro da esquerda é, pelas condições atuais de produção, um gesto militante que deve se diferenciar radicalmente das estéticas alienantes presentes na indústria cultural. Entretanto, é comum encontramos dentro da esquerda o seguinte raciocínio: " É preciso comunicar ideias revolucionárias através das formas artísticas que o proletariado gosta e está familiarizado ". Nesta afirmação existiria uma aparente evidência: fora do folhetim, da linguagem do telejornal, da estética hollywoodiana, não conseguiríamos nos comunicar com os trabalhadores. Será? Que tipo de comunicação um artista de esquerda procura? Seria um conteúdo progressista e uma forma digestiva? Não podemos separar forma e conteúdo(assim como a realidade técnica dos meios com os quais produzimos arte de combate) porque nosso objetivo não é conseguir cordeiros, seguidores, números. Aliás, o objetivo é contribuir através de uma comunicação artística revolucionária com a formação de militantes.
Quem quer controlar as massas? Liberais, fascistas e stalinistas. O objetivo da arte revolucionária é casuar choque, estranhamento, desafiando a própria massificação. Se estamos em menor número não se trata de um problema artístico mas político. As transformações técnicas comprovam que historicamente as obras de arte estão cada vez mais próximas do público. O que Adorno escreveu encaixa-se muito bem nos contextos do rádio e da televisão, mas cai por terra com as tecnologias digitais: por diferentes canais podemos apresentar de forma descentralizada experiências estéticas de contestação. O objetivo é fazer o público pensar, refletir sobre a realidade. Temos muito trabalho pela frente.

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