Atendendo ao pedido de um colaborar do blog, decidimos fazer nesta Edição 50 algo até então inédito: publicar textos literários. Como o leitor sabe, nossa publicação destina-se quase que exclusivamente à teoria estética, aos problemas da reflexão artística no campo do marxismo. Sem deixar esta proposta de lado, decidimos que não existe nenhum contratempo em publicar literatura que se propõe a ser revolucionária ou pelo menos hostil ao presente mundo capitalista. Segue o texto em prosa(sem título, conforme as instruções passadas pelos autor que assina com o seu velho pseudônimo de Geraldo Vermelhão).
" A transição entre a noite e a manhã rompe sob a forma de luz intestinal e fumaça estomacal. Por volta das 5:45 h , carrego em minha mochila, de intenções asfixiantes, a marmita desbotada que preparei na noite anterior. Nas ruas um estranho movimento entre sombras e pássaros pirados, entre mendigos-restos da noite e operários a serem moídos ao longo do dia. Uma garrafa quebrada e uma lâmpada que corta a testa. Acordar e dormir, ou nunca dormir, nunca foi o problema: o problema maior está no sol que se recusa em anunciar mudanças no enredo dos dias.
Um pão de queijo borrachudo é órfão de um pneu furado. Crianças de colo choram num megafone, indiferentes às mãos calosas de mães que protegem seus filhos e duelam a chuva com o sombrinhas furadas e golpeiam as ratazanas com gastas sandálias. Às 6: 10 h o busão transborda num vapor de cachaça, com bonés maquiando olheiras, soldados calados, cabelos oleosos, conversas sobre um gol que poderia ter sido(mas não foi) e fones de ouvido que teletransportam sons de sanfona e cavaquinhos que arrancam fatias do peito quebrado. Gosto de ambos(sanfona e cavaquinho), que na realidade são analgésicos para aguentar um caro itinerário até o trabalho. Quanto ao futebol,não gosto muito. Os gols sufocados são máscaras de gritos que não saem da minha garganta.
A campainha que indica para o busão parar nos pontos, grita ignorando o orvalho chorado que desce mudo pela janela. Às vezes tiro um braço de ferro com riquezas que não sei aonde estão. Sempre perco. Mas com ou sem braço sempre topo um braço de ferro com gente rica ".
Geraldo Vermelhão.
segunda-feira, 30 de janeiro de 2017
segunda-feira, 23 de janeiro de 2017
Boletim Lanterna. Ano 07. Edição 49
O fato de atravessarmos uma grave crise econômica exige que expliquemos, constantemente, as preocupações em torno da arte e da literatura. Já demos provas que nossas motivações ideológicas dispensam taras por bibelôs. A exigência política para aqueles que se dedicam, quando podem, à literatura ou ao cinema, por exemplo, torna-se cristalina quando nos deparamos com o seguinte problema: a representação da realidade por meio de narrativas.
Alguém poderia afirmar que esta é uma questão artisticamente superada; ou então que num mundo com tantas histórias registradas diariamente, por meio de palavras e imagens, de que adiantaria uma narrativa politizada? Mas acontece que raramente se pergunta quem são em grande parte os autores das narrativas das histórias contadas, escritas e filmadas. O fato de muitos escritores viverem nos limites formalistas da arte, acarreta geralmente na elaboração de enredos individualistas, soltos no relativismo das impressões pessoais(e inclusive pessimistas) da realidade. Alguns poderiam achar que estamos insistindo num problema bizantino: a oposição entre objetividade e subjetividade. De jeito nenhum!
De nossa parte existem 2 questões programáticas: 1- Organizar as narrativas dos oprimidos. Estas não podem ser meras impressões do real, mas ações políticas que contrastam rigorosamente com as narrativas que expressam a ideologia da classe dominante. 2- Defender a legitimidade da dialética entre a representação do mundo objetivo e a subjetividade de quem o narra; sendo que a objetividade absoluta é um mito. Se o subjetivismo leva muitas vezes à fuga, não se pode desconsiderar no campo da criação literária a interferência das emoções, da formação intelectual, da ideologia e do temperamento sexual de quem narra. A busca por obras literárias capazes de interferir na vida política passa obrigatoriamente pela pesquisa de recursos estéticos(invenção) e pelo desejo de reconstituir e ao mesmo tempo denunciar a opressão na sociedade capitalista. Voltaremos ao assunto em breve.
Alguém poderia afirmar que esta é uma questão artisticamente superada; ou então que num mundo com tantas histórias registradas diariamente, por meio de palavras e imagens, de que adiantaria uma narrativa politizada? Mas acontece que raramente se pergunta quem são em grande parte os autores das narrativas das histórias contadas, escritas e filmadas. O fato de muitos escritores viverem nos limites formalistas da arte, acarreta geralmente na elaboração de enredos individualistas, soltos no relativismo das impressões pessoais(e inclusive pessimistas) da realidade. Alguns poderiam achar que estamos insistindo num problema bizantino: a oposição entre objetividade e subjetividade. De jeito nenhum!
De nossa parte existem 2 questões programáticas: 1- Organizar as narrativas dos oprimidos. Estas não podem ser meras impressões do real, mas ações políticas que contrastam rigorosamente com as narrativas que expressam a ideologia da classe dominante. 2- Defender a legitimidade da dialética entre a representação do mundo objetivo e a subjetividade de quem o narra; sendo que a objetividade absoluta é um mito. Se o subjetivismo leva muitas vezes à fuga, não se pode desconsiderar no campo da criação literária a interferência das emoções, da formação intelectual, da ideologia e do temperamento sexual de quem narra. A busca por obras literárias capazes de interferir na vida política passa obrigatoriamente pela pesquisa de recursos estéticos(invenção) e pelo desejo de reconstituir e ao mesmo tempo denunciar a opressão na sociedade capitalista. Voltaremos ao assunto em breve.
terça-feira, 17 de janeiro de 2017
Boletim Lanterna. Ano 07. Edição 48
Edmund Wilson, talvez o mais célebre crítico literário da história dos EUA, apresentou dúvidas sobre as relações/as correspondências entre a infraestrutura e a superestrutura. Ainda que discordando inteiramente das conclusões de Wilson(para quem a dialética é um mito), não podemos deixar de observar que ele apresenta uma pergunta central: (...) " Até que ponto e sob quais condições as ideias dos seres humanos atuam sobre suas bases econômicas? "(...). Nem o mais abestalhado dos teóricos de cartilha poderia arriscar uma rala resposta esquemática. É fato que esta pergunta vem sendo, desde o final do ano passado, o cerne de nossas preocupações estéticas. Interessados em compreender e difundir as qualidades políticas revolucionárias das obras de arte, insistimos em algo que enche de dúvidas, risinhos e de terror muitos intelectuais contemporâneos: para nós a história possui um sentido. Ainda que a direção para uma sociedade sem classes não esteja isenta de obstáculos, curvas, contornos e aparentes becos sem saída, nada abala a convicção de que as ideias/imagens podem a partir do seu condicionamento social acelerar as locomotivas da história.
Todos aqueles que como nós consideram o sistema teórico de Marx e Engels como válido, não podem sofrer de preguiça mental: investigar as influências políticas e culturais sobre a base material, é uma tarefa complexa. As investigações marxistas, seja no campo econômico ou estético(ou em qualquer outro) prescinde do estudo da história: é somente através dela, através da reconstituição da totalidade histórica, que obtemos o material ideológico necessário das experiências passadas. Aquelas pessoas que procuram encontrar um veículo voltado para o imediatismo artístico, para a moda da vez , certamente devem passar longe do nosso blog. Para nós não existem fatos antigos ou novidades, mas sim informações acerca do problema artístico(da representação e da função social revolucionária da arte em contextos históricos particulares) e logo análises que são uteis para a emancipação dos trabalhadores. Para nós a criação é luta que porque viver é lutar: luta pela vida, luta contra as imagens e discursos que impedem as mudanças, luta contra aqueles que geram a miséria e luta pela memória de todos os oprimidos que lutaram. No centenário da Revolução russa pretendemos recuperar/debater as imagens anticapitalistas.
Todos aqueles que como nós consideram o sistema teórico de Marx e Engels como válido, não podem sofrer de preguiça mental: investigar as influências políticas e culturais sobre a base material, é uma tarefa complexa. As investigações marxistas, seja no campo econômico ou estético(ou em qualquer outro) prescinde do estudo da história: é somente através dela, através da reconstituição da totalidade histórica, que obtemos o material ideológico necessário das experiências passadas. Aquelas pessoas que procuram encontrar um veículo voltado para o imediatismo artístico, para a moda da vez , certamente devem passar longe do nosso blog. Para nós não existem fatos antigos ou novidades, mas sim informações acerca do problema artístico(da representação e da função social revolucionária da arte em contextos históricos particulares) e logo análises que são uteis para a emancipação dos trabalhadores. Para nós a criação é luta que porque viver é lutar: luta pela vida, luta contra as imagens e discursos que impedem as mudanças, luta contra aqueles que geram a miséria e luta pela memória de todos os oprimidos que lutaram. No centenário da Revolução russa pretendemos recuperar/debater as imagens anticapitalistas.
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