Atendendo ao pedido de um colaborar do blog, decidimos fazer nesta Edição 50 algo até então inédito: publicar textos literários. Como o leitor sabe, nossa publicação destina-se quase que exclusivamente à teoria estética, aos problemas da reflexão artística no campo do marxismo. Sem deixar esta proposta de lado, decidimos que não existe nenhum contratempo em publicar literatura que se propõe a ser revolucionária ou pelo menos hostil ao presente mundo capitalista. Segue o texto em prosa(sem título, conforme as instruções passadas pelos autor que assina com o seu velho pseudônimo de Geraldo Vermelhão).
" A transição entre a noite e a manhã rompe sob a forma de luz intestinal e fumaça estomacal. Por volta das 5:45 h , carrego em minha mochila, de intenções asfixiantes, a marmita desbotada que preparei na noite anterior. Nas ruas um estranho movimento entre sombras e pássaros pirados, entre mendigos-restos da noite e operários a serem moídos ao longo do dia. Uma garrafa quebrada e uma lâmpada que corta a testa. Acordar e dormir, ou nunca dormir, nunca foi o problema: o problema maior está no sol que se recusa em anunciar mudanças no enredo dos dias.
Um pão de queijo borrachudo é órfão de um pneu furado. Crianças de colo choram num megafone, indiferentes às mãos calosas de mães que protegem seus filhos e duelam a chuva com o sombrinhas furadas e golpeiam as ratazanas com gastas sandálias. Às 6: 10 h o busão transborda num vapor de cachaça, com bonés maquiando olheiras, soldados calados, cabelos oleosos, conversas sobre um gol que poderia ter sido(mas não foi) e fones de ouvido que teletransportam sons de sanfona e cavaquinhos que arrancam fatias do peito quebrado. Gosto de ambos(sanfona e cavaquinho), que na realidade são analgésicos para aguentar um caro itinerário até o trabalho. Quanto ao futebol,não gosto muito. Os gols sufocados são máscaras de gritos que não saem da minha garganta.
A campainha que indica para o busão parar nos pontos, grita ignorando o orvalho chorado que desce mudo pela janela. Às vezes tiro um braço de ferro com riquezas que não sei aonde estão. Sempre perco. Mas com ou sem braço sempre topo um braço de ferro com gente rica ".
Geraldo Vermelhão.
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