domingo, 3 de julho de 2016

Boletim Lanterna. Ano 06. Ed 25/26

Se Karl Marx não foi propriamente um esteta, ninguém pode, por mais reacionário que seja, negar que o materialismo dialético operou uma profunda transformação no pensamento estético contemporâneo. Tal transformação não se deve tanto ao profundo conhecimento que Marx possuía em relação à literatura e às artes(aliás, tanto Marx quanto Engels possuíam folego de críticos literários), mas à ruptura com as estéticas idealistas. É claro que o marxismo não é o único termômetro filosófico progressista para analisarmos os problemas artísticos. Entretanto, é o marxismo o caminho mais eficaz para estabelecermos o entendimento quanto ao significado das obras e dos movimentos artísticos ao longo da história.
 O método marxista não leva ao empobrecimento da análise artística: ele a situa concretamente, concebendo a criação artística como fruto de uma necessidade particular. A expressão, a afirmação humana não nascem de um pincel transcendental. É a partir das relações dialéticas entre sujeito e objeto, que a riqueza humana é revelada. Portanto não é o Belo desencarnado, que nega a realidade material/histórica da arte. Não são discursos que vagam pelo ar, desconectados da realidade econômica e política. A arte vem do homem e para o homem:  a arte explicita a força criativa. Quer dizer, a arte não vem de um reino encantado, de uma inspiração divina ou embriagada: a experiência estética não pode ser explicada nem pelo espírito e nem pelas qualidades formais de uma árvore ou de uma paisagem. Dentro de uma relação humanizada com a natureza, o homem cria porque é obrigado a definir a si próprio no mundo. A embriaguez da arte possui raízes materiais.
 Marx não poderia deixar de observar o quanto o sistema capitalista é hostil à arte e à poesia. Não é pra menos: no modo de produção capitalista, impera o trabalho alienado. Neste sentido, a criação artística é um ato politicamente perigoso, que fere o controle sobre a percepção da população. Não é tanto o conteúdo ideológico das obras de arte, mas o que a criação artística pode despertar em seres mutilados pela mesquinha necessidade do dinheiro. Sem dúvida que a ideologia é um dado central na análise marxista; mas a ideologia revolucionária não esgota ou resume o que a arte tem de revolucionário em si mesma. Se a arte pela arte é , sem dúvida, uma doutrina burguesa, a arte que se quer revolucionária não envolve apenas um comentário político: é isso, pode ser isso e muito mais.
 A partir da sua relativa autonomia, a arte é fundamental para a classe operária porque ela apresenta um ponto de vista específico sobre o humano. Se a filosofia e as ciências humanas explicam a realidade, os seres humanos não se expressam, não criam livremente a partir delas as imagens que traduzem suas experiências sensíveis. A arte é uma aliada independente da luta política; e quem quiser saber aonde pisamos não deve se afundar no idealismo, mas numa leitura materialista, histórica e dialética que só o marxismo oferece.

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