A tentativa de fazer do objeto artístico expressão do desejo revolucionário, não é um impulso que nasce e morre nos limites deste mesmo objeto. Ao interferir na consciência que se desenvolve a partir de relações sociais determinadas, o impulso estético visa provocar estragos culturais capazes de abalar o cotidiano. O poema, a peça de teatro, o filme (e por ai vai) não podem ser entendidos como produtos carimbados, cujo efeito/função envolve aquele tempinho de 1 minuto ou 2 horas de duração, para logo em seguida fazer com que as pessoas retomem sua rotina alienada. O volume revolucionário da obra de arte é algo que precisa ser capaz de atingir em cheio a vida, provocando discussões, analises, gerando crises mentais e exigindo um posicionamento de quem toma contato com a obra.
Muita gente subestima o caráter político da arte porque o idealismo ainda come solto neste campo. Nunca se tratou do produto espiritual que transforma por milagre a consciência. A arte é geradora de alterações dos estados mentais, ocasionando não na " boa consciência " mas numa crise nervosa que estimula a desconfiança frente ao modo de vida capitalista: a miséria como consequência do capital, a hipocrisia sexual, o atrofiamento da imaginação, são todos postos a olho nu. Desta maneira, a obra de arte não é mais um objeto que integra-se a um mundo alienado; a obra de arte passa a ser um agente infiltrado na cultura estabelecida, quer dizer, uma atividade livre/criadora dentro da ordem política que procura massacrar a própria existência do trabalho artístico( e boa parte da indústria cultural está aí pra isso, ou seja, para destruir o potencial libertário da arte e sufoca-la como simples mercadoria) .
A dimensão política especifica do objetivo artístico, não é aquela que executa a ordem de um partido político. A arte na sua verdade obedece a um processo independente de criação, que age de diferentes maneiras sobre a consciência. A comunicação revolucionária é portadora de novos signos, de uma nova atitude que incrementa novas relações sociais. Não é passe de mágica, é impacto sensível que atinge a subjetividade. A tomada de consciência sobre a necessidade de uma outra cultura, de uma outra forma de organização econômica e política, passa necessariamente pelo terreno estético.
domingo, 30 de outubro de 2016
domingo, 23 de outubro de 2016
Boletim Lanterna. Ano 06. Edição 40
Vivemos numa época de fragmentações, de puro e descarado relativismo ideológico. Neste contexto a própria palavra arte é questionada, esvaziada e em muitos casos pretexto para mera recreação. Mas por outro lado, deveríamos sentir saudades da solenidade em torno das obras de arte? Enquanto expressão da divisão social do trabalho, o sentido tradicional da palavra arte carrega historicamente as marcas do elitismo. Mas como já nos referimos na edição 36,Walter Benjamin mostrou que no mundo contemporâneo a obra de arte aproximou-se das massas. Entretanto, este abalo da tradição, da aura das obras de arte, não garante prontamente um longo alcance para a arte revolucionária. Atualmente, artistas e militantes precisam lidar com novos problemas históricos.
Um problema maior ganha vulto: num momento em que todo e qualquer objeto torna-se uma obra de arte( e as pesquisas da arte contemporânea abriram alas para esta conclusão) , qual seria o seu diferencial na realidade política? Quais são os verdadeiros desafios da percepção num mundo povoado por pequenos suportes digitais? Como atingir com uma arte politizada subjetividades isoladas, que vivem experiências virtuais coletivas e ignoram a realidade circundante com seus pequenos aparelhos digitais?
Enquanto que respostas pessimistas implicam em cruzar os braços diante da história, tentativas progressistas procuram atuar concretamente sobre este mundo. Um pressuposto necessário para quem lida com questões artísticas, é entender que a arte envolve um distanciamento da realidade ordinária, do cotidiano alienado: a mentira real da imagem, já é em si um mecanismo de grande força política: a realidade da arte choca-se com o mundo real. Na imagem, na ficção, o desejo revolucionário pode prevalecer diante da sociedade conservadora. Talvez o que esteja em crise não é a possibilidade histórica da arte revolucionária(o que por sua vez pressupõe um projeto político socialista, do qual esta arte é expressão independente) mas as estratégias políticas para que ela tenha um papel relevante. Devemos nos perguntar sempre por que as massas não possuem uma atitude de receptividade diante de pinturas, filmes, romances, poemas, peças de teatro e canções que atacam o sistema estabelecido.
Sabemos que a arte combativa desafia a percepção, retira os sentidos de uma situação confortável; logo as massas educadas no conformismo político da cultura de massa, ficam desconfiadas. Mas será que a arte realiza um milagre político isoladamente? A arte não é uma salvadora, única responsável pela tomada de consciência sobre os conflitos sociais. Ela insere-se num conjunto histórico de agitação política. Se a lógica interna da obra de arte pode exercer um efeito anestésico sobre a consciência, ela também pode invalidar a ordem capitalista. O potencial comunicativo da arte é medido pela luta de classes.
Um problema maior ganha vulto: num momento em que todo e qualquer objeto torna-se uma obra de arte( e as pesquisas da arte contemporânea abriram alas para esta conclusão) , qual seria o seu diferencial na realidade política? Quais são os verdadeiros desafios da percepção num mundo povoado por pequenos suportes digitais? Como atingir com uma arte politizada subjetividades isoladas, que vivem experiências virtuais coletivas e ignoram a realidade circundante com seus pequenos aparelhos digitais?
Enquanto que respostas pessimistas implicam em cruzar os braços diante da história, tentativas progressistas procuram atuar concretamente sobre este mundo. Um pressuposto necessário para quem lida com questões artísticas, é entender que a arte envolve um distanciamento da realidade ordinária, do cotidiano alienado: a mentira real da imagem, já é em si um mecanismo de grande força política: a realidade da arte choca-se com o mundo real. Na imagem, na ficção, o desejo revolucionário pode prevalecer diante da sociedade conservadora. Talvez o que esteja em crise não é a possibilidade histórica da arte revolucionária(o que por sua vez pressupõe um projeto político socialista, do qual esta arte é expressão independente) mas as estratégias políticas para que ela tenha um papel relevante. Devemos nos perguntar sempre por que as massas não possuem uma atitude de receptividade diante de pinturas, filmes, romances, poemas, peças de teatro e canções que atacam o sistema estabelecido.
Sabemos que a arte combativa desafia a percepção, retira os sentidos de uma situação confortável; logo as massas educadas no conformismo político da cultura de massa, ficam desconfiadas. Mas será que a arte realiza um milagre político isoladamente? A arte não é uma salvadora, única responsável pela tomada de consciência sobre os conflitos sociais. Ela insere-se num conjunto histórico de agitação política. Se a lógica interna da obra de arte pode exercer um efeito anestésico sobre a consciência, ela também pode invalidar a ordem capitalista. O potencial comunicativo da arte é medido pela luta de classes.
domingo, 16 de outubro de 2016
Nota de pesar
Devido ao falecimento do pai de Thyago Villela, amigo querido e colaborador deste periódico, nesta semana não publicaremos a edição 40.
domingo, 9 de outubro de 2016
Boletim Lanterna. Ano 06. Edição 39
Certamente os artistas e escritores mais corajosos dos nossos dias não se esquivam das questões políticas. Enquanto que muitos condicionam suas necessidades expressivas de acordo com o jogo do relativismo, criando obras que apesar do eventual valor artístico fazem coro com a ordem capitalista, alguns poucos apostam na provocação. Tratando-se das artes visuais, os exemplos mais interessantes encontram-se entre aqueles que pesquisando variados suportes do mundo urbano, questionam os limites entre mercadoria e obra de arte, entre representação e realidade, entre imagem e ação. Na literatura, como já insistimos aqui em outras ocasiões, a bola da vez está entre os escritores das periferias do Brasil: expressões literárias originais, se fazem presentes em saraus populares que contrastam com as crises existenciais do escritor pequeno burguês exilado em seu apartamento.
Apesar de minoritárias, as formas artísticas que exprimem o inconformismo político, se fazem presentes no mundo de hoje. Muitas destas manifestações artísticas não são revolucionárias. Isto é motivo para a esquerda não leva-las a sério? Não, existem variados caminhos ideológicos para a arte. Um artista não é obrigado a seguir nenhuma voz de comando exterior para realizar sua obra: a arte é fruto de uma necessidade específica, que não pode se sujeitar a um molde ideológico. A contribuição política de uma obra de arte precisa ser encarada a partir da sua vigência estética. Porém, se a arte é inevitavelmente ligada à política, seu caráter revolucionário não é uma questão estilística mas uma necessidade histórica: ao optar pela classe trabalhadora, o artista torna-se um aliado na luta política. Preservando sua relativa autonomia, a arte que pretende cumprir um papel revolucionário, deve ir além da crítica pontual para tornar-se expressão que condena a sociedade de classes.
Há pelo menos 150 anos, o que existe de realmente relevante na arte e na literatura se caracteriza pelo confronto com a sociedade burguesa. Obras de arte que vivem numa redoma de vidro, isoladas dos problemas do mundo real, cumprem um papel de enfeite da civilização capitalista; e hoje não é diferente. Quando afirmamos que a arte possui um papel revolucionário, não estamos impondo uma norma mas apresentando uma evidência do nosso tempo: se o artista deve ser inteiramente livre para solucionar esteticamente suas inquietações interiores, ao mesmo tempo ele não poderá realmente faze-lo se consentir com os valores do capitalismo. Portanto o caminho que defendemos para a arte é o mesmo caminho político que deve libertar politicamente a classe trabalhadora: o socialismo. Se faz necessário que os artistas e escritores mais ousados dos nossos dias, compreendam a fundo a necessidade da arte ser uma força revolucionária:o desejo de libertar o homem exige que a arte volte-se violentamente, no plano da expressão, contra a realidade capitalista.
A formação política do artista de esquerda é uma questão da maior urgência. Não se trata de estudar o marxismo para aplicar mecanicamente conceitos filosóficos na representação artística; afinal é exatamente o contrário que o marxismo ensina: são as representações e intuições que, ao apreenderem o mundo concreto, tornam-se o ponto de partida para o surgimento dos conceitos. Conhecer profundamente o pensamento marxista, livre das deformações stalinistas, é um ganho intelectual para os artistas que não querem enfeitar a realidade, mas sim transforma-la.
Apesar de minoritárias, as formas artísticas que exprimem o inconformismo político, se fazem presentes no mundo de hoje. Muitas destas manifestações artísticas não são revolucionárias. Isto é motivo para a esquerda não leva-las a sério? Não, existem variados caminhos ideológicos para a arte. Um artista não é obrigado a seguir nenhuma voz de comando exterior para realizar sua obra: a arte é fruto de uma necessidade específica, que não pode se sujeitar a um molde ideológico. A contribuição política de uma obra de arte precisa ser encarada a partir da sua vigência estética. Porém, se a arte é inevitavelmente ligada à política, seu caráter revolucionário não é uma questão estilística mas uma necessidade histórica: ao optar pela classe trabalhadora, o artista torna-se um aliado na luta política. Preservando sua relativa autonomia, a arte que pretende cumprir um papel revolucionário, deve ir além da crítica pontual para tornar-se expressão que condena a sociedade de classes.
Há pelo menos 150 anos, o que existe de realmente relevante na arte e na literatura se caracteriza pelo confronto com a sociedade burguesa. Obras de arte que vivem numa redoma de vidro, isoladas dos problemas do mundo real, cumprem um papel de enfeite da civilização capitalista; e hoje não é diferente. Quando afirmamos que a arte possui um papel revolucionário, não estamos impondo uma norma mas apresentando uma evidência do nosso tempo: se o artista deve ser inteiramente livre para solucionar esteticamente suas inquietações interiores, ao mesmo tempo ele não poderá realmente faze-lo se consentir com os valores do capitalismo. Portanto o caminho que defendemos para a arte é o mesmo caminho político que deve libertar politicamente a classe trabalhadora: o socialismo. Se faz necessário que os artistas e escritores mais ousados dos nossos dias, compreendam a fundo a necessidade da arte ser uma força revolucionária:o desejo de libertar o homem exige que a arte volte-se violentamente, no plano da expressão, contra a realidade capitalista.
A formação política do artista de esquerda é uma questão da maior urgência. Não se trata de estudar o marxismo para aplicar mecanicamente conceitos filosóficos na representação artística; afinal é exatamente o contrário que o marxismo ensina: são as representações e intuições que, ao apreenderem o mundo concreto, tornam-se o ponto de partida para o surgimento dos conceitos. Conhecer profundamente o pensamento marxista, livre das deformações stalinistas, é um ganho intelectual para os artistas que não querem enfeitar a realidade, mas sim transforma-la.
domingo, 2 de outubro de 2016
Boletim Lanterna. Ano 06. Edição 38
A maneira como o marxismo deve proceder em relação aos problemas da arte e da literatura, é entendida de diferentes maneiras. Não faltam aqueles militantes de esquerda que, ignorando as implicações especificas da estética, caem nos limites de um sociologismo da arte. Para o materialismo histórico dialético existem 2 problemas postos: 1- Explicar a relativa autonomia e o condicionamento histórico da arte. 2- Pensar a maneira como a arte e a literatura podem influenciar na realidade política.
No primeiro caso, existe o risco do mecanicismo: a exemplo do que os primeiros teóricos marxistas disseram, a arte seria um mero reflexo das determinações econômicas de uma dada civilização. Evidentemente que para o marxismo as relações entre infraestrutura e superestrutura são o ponto de partida dialético para se refletir sobre as questões artísticas: enquanto esferas da superestrutura, a arte e a literatura dependem de uma existência material, de um nível específico de desenvolvimento das forças materiais, sendo a criação estética, independentemente da vontade do artista, expressão ideológica de uma forma de organização social. Porém, o caráter ideológico da arte ou sua significação política numa sociedade dividida em classes, não encerra/define a necessidade da criação artística.
Fonte de afirmação, de objetivação do humano, a arte é um trabalho criador que possui as suas próprias leis: a dinâmica psicológica, que possui suas raízes no corpo e no próprio movimento da história, é geradora de novas necessidades de expressão e comunicação. As transformações históricas da arte possuem relações com as mudanças psicológicas que repousam nas próprias transformações do meio social; logo a história da arte e da literatura não envolve uma mera sucessão de estilos e escolas, mas mudanças históricas mais profundas que assumem formas artísticas particulares. Embora a arte exista como ideologia dentro da luta de classes, ela não existe por causa disso. A arte busca harmonia e plenitude.
Mas como a arte e a literatura poderiam existir como trabalho criador se o trabalho alienado mina suas possibilidades criativas? Sendo assim, a divisão social do trabalho no capitalismo, obriga os artistas e escritores a assumirem uma posição: ou consentir com o esmagamento do humano realizado pelo capital, ou posicionar-se de acordo com uma perspectiva política socialista. Não existe meio termo, não tem como fugir da história. Perante as novas realidades digitais, perante as contradições presentes na industrialização da cultura, a arte só pode seguir no caminho da emancipação humana. Inevitavelmente a criação artística deve ser um gesto de revolta, de oposição. A arte revolucionária não é uma determinação burocrática que subordina a estética à política. Arte revolucionária é um conjunto de esforços que pelos seus próprios caminhos estéticos é anticapitalista. A influência política revolucionária da arte, depende de uma intensa articulação entre as necessidades expressivas do artista e as formas de comunicação que revelam os cadeados do capitalismo(e logo a necessidade de destruí-los).
No primeiro caso, existe o risco do mecanicismo: a exemplo do que os primeiros teóricos marxistas disseram, a arte seria um mero reflexo das determinações econômicas de uma dada civilização. Evidentemente que para o marxismo as relações entre infraestrutura e superestrutura são o ponto de partida dialético para se refletir sobre as questões artísticas: enquanto esferas da superestrutura, a arte e a literatura dependem de uma existência material, de um nível específico de desenvolvimento das forças materiais, sendo a criação estética, independentemente da vontade do artista, expressão ideológica de uma forma de organização social. Porém, o caráter ideológico da arte ou sua significação política numa sociedade dividida em classes, não encerra/define a necessidade da criação artística.
Fonte de afirmação, de objetivação do humano, a arte é um trabalho criador que possui as suas próprias leis: a dinâmica psicológica, que possui suas raízes no corpo e no próprio movimento da história, é geradora de novas necessidades de expressão e comunicação. As transformações históricas da arte possuem relações com as mudanças psicológicas que repousam nas próprias transformações do meio social; logo a história da arte e da literatura não envolve uma mera sucessão de estilos e escolas, mas mudanças históricas mais profundas que assumem formas artísticas particulares. Embora a arte exista como ideologia dentro da luta de classes, ela não existe por causa disso. A arte busca harmonia e plenitude.
Mas como a arte e a literatura poderiam existir como trabalho criador se o trabalho alienado mina suas possibilidades criativas? Sendo assim, a divisão social do trabalho no capitalismo, obriga os artistas e escritores a assumirem uma posição: ou consentir com o esmagamento do humano realizado pelo capital, ou posicionar-se de acordo com uma perspectiva política socialista. Não existe meio termo, não tem como fugir da história. Perante as novas realidades digitais, perante as contradições presentes na industrialização da cultura, a arte só pode seguir no caminho da emancipação humana. Inevitavelmente a criação artística deve ser um gesto de revolta, de oposição. A arte revolucionária não é uma determinação burocrática que subordina a estética à política. Arte revolucionária é um conjunto de esforços que pelos seus próprios caminhos estéticos é anticapitalista. A influência política revolucionária da arte, depende de uma intensa articulação entre as necessidades expressivas do artista e as formas de comunicação que revelam os cadeados do capitalismo(e logo a necessidade de destruí-los).
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