Apresentamos A Goteira e a Consciência, de Geraldo Vermelhão
" Ele acordou com as gotas geladas que caiam sobre seu rosto magro. Ela já estava de pé, preparando um café ralo que dói. Uma segunda feira que começa às 3:30 h da madrugada é um dos piores xingamentos que a vida poderia dar a um casal de trabalhadores. A vida? Por que será que tudo precisa doer no corpo? Sono, gripe, noites mal dormidas, fila de hospital e um salário que mal dá para o leite em pó do filho pequeno.
Ele pegou rapidamente um balde, colocou sobre o leito que não passava de um colchão rasgado, com a espuma saltando pra fora. Conforme as gotas caiam de um modo hostil sobre o balde, ele e ela ficaram olhando para o colchão. Não era propriamente um ninho de amor, mas o casal de operários já tinha se amado sinceramente(e loucamente) naquele colchão. Entretanto, naquela madrugada, aquilo não se parecia com um colchão: aquilo era um objeto machucado e retorcido, assim como o corpo deles. Mesmo que economizassem por alguns meses, de que adiantaria comprar outro colchão, se os corpos cansados, carentes de energia,não passavam de um velho colchão? Qual seria o futuro da criança, que dormia sob um amontoado de retalhos e que cresceria antes que os pais conseguissem dinheiro para comprar um berço? Alguma coisa precisaria ser feita. No final da tarde daquele dia, companheiros de trabalho do casal iriam se reunir para discutir o futuro da categoria. O casal foi, despertado pela goteira do telhado. "
Geraldo Vermelhão
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