sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

A CANÇÃO ENQUANTO O SOM DA LUTA



A fragmentação da informação tem possibilitado um significado
ambíguo no plano da música. Sabem como é, enquanto a pluralidade de
estilos musicais circula por diferentes meios(inclusive internet) o
efeito das canções no plano da sensibilidade dos ouvintes se dilui
numa variedade sonora cujo o único laço que amarra tudo é o espectro
comercial(ah cara, o velho porrete que quebra a espinha da bela
melodia...). Evidentemente que enquanto tem músicas de novela, hits de
verão e musiquinhas descartaveis no dia a dia nesta sociedade colonial
que é o Brasil, também existe uma troca inteligente entre ouvintes que
ao trocarem entre si diversos arquivos musicais de forma online,
acabam por tentar estabelecer uma identidade social consciente entre
eles e suas canções preferidas. O interessante é que nestes grupos
tanto a música de décadas anteriores quanto de hoje parecem existir no
mesmo plano, criando uma espécie de "espaço suspenso ". Na minha
opinião não é nada disso: questões estéticas e políticas de outros
períodos musicais não foram resolvidas e tudo leva a crer que com a
qualidade sonora das novas mídias(incluindo a velocidade na hora de
armazenar e difundir coisas do baú e ao mesmo tempo criar novas
canções) a força política da música pode cada vez mais se tornar
maior.
   Vamos tomar como exemplo a MPB que muito antes de se tornar trilha
sonora para passeio de domingo de manhã com suco de laranja, já foi
uma sigla de protesto: durante o regime militar a canção cumpria o seu
papel de enfrentamento na denúncia contra a ditadura. Sim, eu sei que
todos não aguentam mais falar nisso, mas a verdade é que os debates
daquela época heróica para artistas de esquerda, nunca sairam da pauta
cultural. Querem ver? Então vejam a Tropicália que ainda tem um gosto
infinito de novidade. Mesmo em tempos atuais quando a juventude não se
choca mais com guitarras elétricas na música brasileira, o
tropicalismo por ter sido interrompido violentamente pela represão,
ainda repercute entre os jovens nem tanto por problemas ligados a
forma da canção mas pela necessidade de uma postura crítica, violenta,
paródica, combativa, que faz falta. Nostalgia de 1968? Não, é uma
necessidade para a conjuntura cultural de 2012-13. Aliás, muitos
compositores e muitas bandas que exerceram um papel contestador na
conjuntura política/cultural de 1968 precisam ser resgatados em suas
implicações propriamente musicais:é desta herança musical que plasmou
a revolta em melodias que podemos retomar o debate sobre a natureza
política da música. Vejam por exemplo os Rolling Stones: evidentemente
que as comemorações dos 50 anos da banda acompanhada de uma campanha
milionária, não pode atender as aspirações musicais da juventude
proletária. Entretanto, quando ouvimos os Stones originalmente em
canções como Street Fighting Man, Get Off My Cloud e Simpathy For The
Devil(caberia lembrar como o processo de composição desta última
canção foi muito bem costurado pela câmera de Jean Luc Godard no filme
One Plus One, de 1968)  não podemos deixar de sentir em nossos
cérebros e quadris uma paixão revolucionária que só pode servir ao
proletariado interessado em reeler o que presta na História do rock.
   É claro que existem hoje compositores conscientes do protesto, da
crítica e da revolta em suas canções. Alguns poucos sambistas, algumas
bandas de punk rock(incluindo as derivações musicais deste) e um pouco
mais de rappers, colocam uma carga de contestação política e cultural
em suas letras(ainda que nem todos saibam bem qual é que é, quero
dizer, não saibam bem que tipo de
sociedade desejam, faltando assim horizonte utópico, ideologia
definida). Se alguns acabam caindo naquela de fazer críticas
refomistas que na pratica funcionam enquanto choro de criança aos pés
do capital, por outro lado o tal do download e outras transas
cibernéticas podem ter um uso progressista, anticapitalista para ser
mais exato. É neste momento, por estas brechas que os musicos e fãs de
música precisam agir não enquanto colecionadores ou ouvintes
descompromissados de música de celular, mas enquanto críticos e
artistas que conscientes da necessidade da música ser expressão de um
outro projeto de sociedade, apontem para a criação de novos cenários
musicais.
  Posição política revolucionária em música não significa ser
patrulheiro ideológico como já ocorreu muito em nossa História
recente(dos nacionalistas sessentistas que perseguiam o rock aos
intolerantes do movimento punk que se fecharam em sectarismos
estéticos). Significa saber que não existe luta política sem uma
trilha sonora da pesada acompanhando tudo.

                                      Tupinik

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

SAUDAÇÕES AO TEATRO POLÍTICO DA CIA. ANTROPOFÁGICA:


Mais do que nunca artistas reacionários, acadêmicos ultra-direitistas
e a imprensa burguesa insistem em promover um abismo ideológico entre
arte e política. Neste processo que ocila entre o liberalismo cultural
e a tara fascista, o teatro torna-se um setor reprimido por estas
mesmas forças(dominantes em nosso país). Isto não é pra menos: a
força política do teatro tende a perturbar. Poucas companhias teatrais
possuem a consciência exata deste papel político do teatro; dentre
elas cabe destacar a Cia.Antropofágica, que está em cartaz em São
Paulo com a peça Terror e Miséria No Novo Mundo(inspirada na peça
Terror e Miséria do Terceiro Reich, de Bertolt Brecht). Diretamente da
pequena trincheira cultural do Lanterna aplaudimos de pé a Cia.
Antropofágica, que milita com propriedade e competência cênica por
este teatro. Eles não temem ao diálogo entre artistas (como o
realizado entre Brecht e Kantor no citado espetáculo); afinal o
dinamismo enriquece, amplia o alcance do teatro político. Discordamos
daqueles que julgam o citado espetáculo da companhia como sendo uma
confusão entre engajamento político e a geleia geral de procedência
tropicalista. Muito pelo contrário: a consciência dialética que opta
pela tensão entre estas duas correntes estéticas(tanto Brecht quanto o
tropicalismo não sairam do horizonte cultural brasileiro) não leva aos
clichês mas ao teatro político mais eficaz realizado no Brasil de
hoje.


Lenito.

TRECHO DO PROGRAMA TEATRAL DO PROLETKULT



Em duas palavras: o programa teatral do Proletkult não consiste na "
utilização dos valores do passado ", nem na " invenção de novas formas
de teatro ",  mas na abolição da própria instituição do teatro
enquanto tal, substituindo-a por um local de apresentação de
experiências que visam a elevar o nível organizacional da vida
coletiva das massas. A organização de oficinas de trabalho e a
elaboração de um sistema científico para a elevação deste nível são
tarefas imediatas da sessão científica do Proletkult no campo teatral.
   As demais atividades estão sob o signo do " por enquanto ";
execução das tarefas secundárias, não daquelas essenciais para o
Proletkult. Este " por enquanto ", apresenta duas linhas, tendo ambas
por lema o conteúdo revolucionário:


1- TEATRO FIGURATIVO - NARRATIVO(estático, de costumes - ala direita)

2- TEATRO DE AGI-ATRAÇÕES(dinâmico e excêntrico - ala esquerda)



...Atração (do ponto de vista teatral) é todo aspecto agressivo do
teatro, ou seja, todo elemento que submete o espectador a uma ação
sensorial ou psicológica, experimentalmente verificada e
matematicamente calculada, com o propósito de nele produzir certos
choques emocionais, que por sua vez, determinem em seu conjunto
precisamente a possibilidade do espectador perceber o aspecto
ideológico daquilo que foi exposto, sua conclusão ideológica final.





                                                  Sergei Eisenstein, 1923.


O SONHO E O CINEMA


 Eis um cinema mais maravilhoso que qualquer outro. Quem goza do dom
de sonhar sabe que nenhum filme pode equivaler em imprevisto, em
tragicidade, a essa vida incontestável que passa durante o sono. Do
desejo do sonho participam o gosto e o amor pelo cinema. Na falta da
aventura espontânea que nossas pálpebras deixarão fugir ao despertar,
vamos ás salas escuras em busca do sono artificial,  talvez do
estimulante capaz de povoar nossas noites solitárias. Gostaria que um
cineasta se enamorasse desta idéia: na manhã seguinte a um pesadelo,
que ele anotasse exatamente de tudo que se recordasse e dai partisse
para uma reconstituição minuciosa. Não se trata mais então de lógica,
de construção clássica ou de adular a incompreensão pública, mas de
coisas vistas, de um realismo superior na medida em que abre novo
campo á poesia e ao sonho.



                                 Robert Desnos, 1923.


domingo, 16 de dezembro de 2012

A LITERATURA ENQUANTO SEMENTEIRA DA REVOLUÇÃO



...O trabalho do escritor, á margem do tempo e das tarefas imediatas
é o de alimentar a sementeira da Revolução, para que quando ela
germine a emoção e a esperança atormentada do militante encontrem o
que colher... A liberdade do escritor quebra as tábuas dos mandamentos
partidários.


                                    Patrícia Galvão, 1945.

QUANDO OS PARTIDOS DE ESQUERDA MANIPULAM EXPOSIÇÕES DE ARTES PLÁSTICAS



"... A solução unitária é pois a primeira nota falsa a soar na
decantada realização artística, aliás um certame de caráter
beneficiente , que a manha dos espertos timbra em cobrir com a
desculpa de que faz arte, quando o que realiza é a adesão ao Partido,
pretendendo jogar poeira nos olhos dos artistas, do público e dos
crentes. "



                                Geraldo Ferraz, 1945.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

SOBRE A IMPORTÂNCIA DA ARTE MODERNA



Qualquer que seja o juízo que se faça sobre os resultados da
Revolução moderna quanto ao seu valor permanente , é indubitável
tratar-se de uma Revolução espiritual de maior profundidade. O impasse
atual provavelmente será vencido por uma espécie de arte cujos meios
técnicos serão sobretudo de ordem mecânica e instrumental.


                                            Mário Pedrosa, 1952.

OS RUMOS DA LITERATURA ENGAJADA



... Não basta mais denunciar, com belo estilo, os abusos e as
injustiças, nem descrever com brilhantismo e negatividade a psicologia
da classe burguesa, nem mesmo colocar nossa pena a serviço dos
Partidos sociais: para salvar a literatura é preciso tomar posição na
nossa literatura, pois a literatura é por essência tomada de posição.
Devemos rechaçar em todos os domínios as soluções que não se inspirem
rigorosamente em princípios socialistas, mas ao mesmo tempo nos
afastar de todas as doutrinas e movimentos que considerem o socialismo
como um fim absoluto.

Jean Paul Sartre, 1947.

A CULTURA E A ARTE



No mundo de hoje, toda a cultura, toda a literatura e toda a arte
pertencem a classes determinadas. Realmente não existe arte pela arte,
nem arte que esteja acima das classes, uma arte que se desenvolve fora
da política ou independentemente desta.
A literatura e a arte proletárias são uma parte do conjunto da causa
revolucionária do proletariado.


                               Mao Tsé Tung, 1942.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A REVOLUÇÃO É UMA ESTÉTICA.



A única opção do intelectual do mundo subdesenvolvido entre ser um "
esteta do absurdo " ou um " nacionalista romântico " é a cultura
revolucionária. Como poderá o intelectual do mundo subdesenvolvido
superar suas alienações e contradições e atingir uma lucidez
revolucionária? Através do exame crítico de uma produção reflexiva
sobre dois temas justapostos:

  - O subdesenvolvimento e sua cultura primitiva

  - O desenvolvimento e a influência colonial de uma cultura sobre o
mundo subdesenvolvido

   Os valores da cultura monárquica e burguesa do mundo desenvolvido
devem ser criticados em seu próprio contexto e em seguida transportar
em instrumentos de aplicação úteis a compreensão do
subdesenvolvimento.
 A cultura colonial informa o colonizado sobre a sua própria condição.

  O auto-conhecimento deve provocar em seguida uma atitude
ante-colonial, isto é negação da cultura colonial e do elemento
inconsciente da cultura nacional, erradamente considerados valores
pela tradição nacionalista. Deste violento processo dialético da
informação, análise e negação, surgirão duas formas concretas de uma
cultura revolucionária:

 A Didática/Épica
 A Épica/Didática

A Didática e a Épica devem funcionar simultaneamente no processo revolucionário.

 A Didática: Alfabetizar, informar, educar, conscientizar as massas
ignorantes, as classes médias alienadas

 A Épica: Provocar o estímulo revolucionário

 A Didática será cientifica. A Épica será prática poética, que terá de
ser revolucionária do ponto de vista estético para que projete
revolucionariamente seu objetivo ético. Demonstrará a realidade
subdesenvolvida, dominada pelo complexo de impotência intelectual,
pela admiração inconsciente da cultura colonial, a sua própria
possibilidade de superar, pela prática revolucionária, a esterilidade
criativa.

 A Épica, precedendo e se processando revolucionariamente, estabelece
a Revolução como cultura natural. A arte passa a ser, pois, Revolução.
 Neste instante a cultura a passa a ser norma, no instante em que a
Revolução é uma nova prática do mundo intelectualizado.
 A Didática sem a Épica gera a informação estéril e degenera em
consciência passiva nas massas e em boa consciência dos intelectuais.
 É inofensiva
 A Épica sem Didática gera romantismo moralista e degenera em
demagogia histérica
 É totalitária

A nova cultura revolucionária, Revolução em si no momento em que criar
é revolucionar, em que criar é agir tanto no campo da arte quanto no
campo político e militar é o resultado de uma Revolução cultural
histórica concretizando-se , no mesmo complexo, História e Cultura.
 O objetivo infinito da liberação revolucionária é proporcionar ao
homem uma capacidade cada vez maior de produzir seus materiais e
utiliza-los segundo o desenvolvimento mental.
 A Revolução elevará a sociedade subdesenvolvida a categoria
desenvolvida a ai surgirá uma nova necessidade: a ação
desmistificadora dos nacionalismos culturais, a ação civilizadora
contra mitos e tradições conservadoras, a ação substituta de valores
integrais da colaboração humana, a que se limita pelas remanescências
do falho significado burguês da individualidade.
 O sentimento de colaboração humana renova e revela uma nova categoria
de individuo, mas é necessário pra isso que a velha cultura seja
revolucionária. Neste estágio, A Épica Didática necessita do
instrumental cientifico psico-analitico a fim de fazer de cada homem
um criador que, de posse consciente e informada de todos os seus
instrumentos mentais, possa fazer a Revolução das massas criadoras.


                                Glauber Rocha, 1967.

O GRANDE MASTURBADOR.




Salvador Dali, 1929.

sábado, 1 de dezembro de 2012

O PROBLEMA DA REPRESENTAÇÃO DA MISÉRIA SOCIAL EM ARTE:

Até algumas décadas atrás denunciar a pobreza e as desigualdades
sociais por meio da arte, envolvia ou a estratégia estética correta
para agredir os nervos do espectador(ou do leitor no
caso da literatura) visando mobilizar a sensibilidade para motivar
ações políticas, ou o grande risco da demagogia, recaindo assim no
despertar de emoções como " pena " e impulsionando assim atitudes
caridosas e portanto contra-revolucionárias. Mas quando nos debruçamos
sobre esta mesma questão da arte enquanto instrumento de denúncia do
capitalismo, novas presepadas da cultura dominante são armadas hoje.
Vejamos como por exemplo o cinema e a Tv tornam-se expressões de um
falso otimismo econômico e de uma mitificação heróica das desigualdades.
Tanto em filmes quanto em novelas percebemos a falsa farra do boi
quando aparece a idéia de " ascenção da classe C ":O suburbio, as
periferias, o morro , tudo surge enquanto um estilo de vida, um modo
de ser "pobre mas honesto ". Sabemos que estes espaços não são
naturais mas realidades urbanas decorrentes da exploração capitalista.
Tudo indica que os programas sociais do governo possuem o seu
correlato estético: Melhorando minimamente mas não resolucionando a
miséria, o povo brasileiro é apresentado tanto no cinema quanto na
teledramaturgia como sendo orgulhoso de sua falta de informação, de
seu conformismo, de sua alegria desesperada nas partidas de futebol,
no gole da cerveja, na sensualidade que coisifica, no som do pagode ou
do funk, etc.
É curioso como na mudança de um plano para o outro a câmera(neste
contexto comercial a diferença entre a linguagem televisiva e
cinematográfica é cada vez menor)salta pelos contrastes das grandes
cidades sem em nenhum momento estabelecer a relação imagética entre as
contradições urbanas. Nesta pobreza gramatical o folhetinesco e a
estrutura policial hollywoodiana reinam de forma despótica, reprimindo
no público a possibilidade de refletir sobre possiveis transformações
históricas.
Diante deste poder que abocanha o público, como os artistas
revolucionários devem agir? Creio que parte da resposta já se encontra
nas comunidades das periferias. Dotados de uma produção cultural
original são os representantes destas que devem continuar a articular
novos espaços de exposição artística numa perspectiva estética e
ideológica que não tratam a miséria como exotismo popular, uma
paisagem natural, mas enquanto vontade popular de transformação.
Portanto, a saida objetiva para que o tema da miséria social não seja
visto como orgulho dos " injustiçados " mas enquanto agressividade
expressiva, está
no papel que os militantes de movimentos sociais podem desempenhar
culturalmente junto a estas comunidades:a ação cultural dentro dos
movimentos políticos deve proporcionar o debate e a produção artística
com base em um projeto de transformação. Neste processo a figura do
militante da cultura é uma necessidade política da classe trabalhadora
e enquanto a esquerda brasileira não estimular totalmente a sua
capacidade de participação na elaboração de uma nova arte, muito pouco
será feito contra a ideologia dominante .
Uma enorme tarefa se coloca de pronto para a arte que não se
fundamenta no reformismo e no culto da ignorância, mas no desejo
libertador.


Geraldo Vermelhão

A LIBERDADE GUIANDO O POVO



Delacroix, 1830.