A morte de Fidel Castro rendeu brindes entre os setores mais reacionários da intelectualidade. Perante o atual quadro conservador, o falecimento de um revolucionário gera um sabor simbólico de vitória burguesa, uma cereja colocada no bolo do capital. Não faltam jornalistas e historiadores dispostos a sepultar a Revolução cubana de 1959; batendo inclusive na previsível tecla de que haveria liberdade na democracia burguesa enquanto que o socialismo, tendo em vista aquilo que classificam como inevitável " caminho totalitário ", jamais poderia criar uma nova cultura. Mas antes de apontar as debilidades desta falsa dicotomia(intencionalmente sustentada pela mídia capitalista), devemos frisar que a Revolução cubana, em seus acertos e erros, abriu alas para os debates culturais que colocaram a América Latina como centro estratégico para se pensar as relações entre arte e revolução.
Qualquer liberal se enche de energia para dizer que o regime cubano sempre massacrou artistas e intelectuais. Isto é fato? Levando em conta que o alinhamento político cubano , em boa parte de sua história revolucionária, passa pelo stalinismo, não é difícil imaginarmos o quanto isto representou dificuldades para o livre desenvolvimento das formas de arte revolucionária na ilha. Sobretudo a partir de 1971, a vida cultural cubana perdeu a chance histórica de erguer um modelo político libertador para os povos latino americanos. Porém, paradoxalmente, foi graças ao processo revolucionário cubano que as concepções estéticas do marxismo na América Latina ganharam força novamente. Para se ter a exata noção deste fato, é necessário relaciona-lo com a vida política como um todo: os barbudos colocaram o imperialismo norte americano para correr.
Se a Revolução cubana herdou as deformações do stalinismo, e isto aplicou-se em parte na vida literária e artística, é preciso considerar a partir do prisma dialético os horizontes abertos por este acontecimento histórico. A cultura tornou-se revolucionária porque a política trouxe profundas transformações sociais em Cuba. É gozado como os intelectuais que esculhambam a Revolução de 1959, não mencionarem como era a vida da população cubana anteriormente. Como era a vida das crianças que vendiam frutas nas ruas, a vida das mulheres que eram obrigadas a se prostituir, a vida dos camponeses famintos, a vida dos operários explorados, a vida dos estudantes e intelectuais perseguidos pela ditadura de Fugêncio Batista, etc. Pois bem, a Revolução arrebentou com este quadro miserável. É claro que o autoritarismo e a intolerância presentes nos quadros do governo revolucionário trouxeram resultados desastrosos, e comprometedores sob o ponto de vista socialista. Entretanto, uma nova cultura só poderia nascer da Revolução e não de uma sociedade que era fantoche dos EUA. A miséria enquanto consequência da exploração econômica, só poderia ser erradicada com o fim do imperialismo.
Não podemos simplesmente afirmar que a arte revolucionária em Cuba foi um mero reflexo do Realismo Socialista. As atividades em torno do ICAIC(Instituto Cubano Del Arte e Industria Cinematográfica ), da Escuela de Letras de La universidad De La Habana e publicações como El Caimán Barbudo, revelam intensos debates estéticos entre o jdanovismo e a liberdade artística. Vale lembrar que estas discussões não ficaram nos limites do território cubano, pois inflamaram a vida artística de vários outros países, incluso o Brasil( que o diga o movimento do Cinema Novo!). Em nossa opinião é preciso combater a burocracia e as deformações do marxismo: é por isso que realizamos a crítica da Revolução cubana. Mas ao mesmo tempo, enquanto pessoas de esquerda, não podemos negar as conquistas(ainda que contraditórias) da própria Revolução. Desde já, críticos, artistas e historiadores de esquerda devem estudar, preservar e difundir as contribuições e os erros presentes na arte revolucionária legada por Cuba.
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