sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Uma manhã no coração da África

Durante mil anos tu, negro, sofreste como um animal.
tuas cinzas foram espalhadas ao vento no deserto.
Teus tiranos construiram os templos mágicos e brilhantes.
onde preservam tua alma, onde preservam teu sofrimento:
o bárbaro direito dos punhos e o direito branco ao chicote.
Tu tinhas direito de morrer, também podias chorar.
Em teu totem esculpiram fome e cativeiros sem fim.
E no abrigo dos bosques aceitavas uma morte- horrivelmente cruel,
oculta desafiadora com galhos
de espinheiros e copas de árvores.
Cingindo teu corpo e tua dolente alma.
então puseram uma grande víbora traiçoeira em teu peito.
Em teu colo colocaram o jugo da aguardente.
Trocaram tua vida agradável pelo brilho das pérolas baratas.
tuas maravilhosas e incomensuráveis riquezas.
Da tua choça, o tantã soava na escuridão da noite.
levando tristes lamentos para as fontes de rios poderosos
sobre jovens violadas, rios de sangue e lágrimas,
sobre barcos que zarpavam para o país, onde o homenzinho
se agita como num formigueiro, e onde o dólar é rei.
na terra condenada, que chamam de mãe pátria.
Ali teu filho e tua esposa foram esmagados, dia e noite,
por um moinho desapiedado, destroçando-os
com terrível dor
Eras um homem como outros . Pregaram para que cresses
que o bom deus branco reconciliara por fim todos os homens.
pelo fogo sofreste, e cantaste os cantos plangentes
do mendigo sem lugar, que canta nas portas das casas.
E quando a loucura te possuiu e teu sangue ferveu na noite,
dançaste, gemeste
como a fúria de uma tormenta nas palavras de uma
melodia humana
De mil anos de padecimentos, surgiu uma força de ti.
na voz metálica do jazz, um grito de libertação desconhecido,
que ressoou no continente como uma marulhada gigante.
O mundo inteiro, surpreendido, despertou aterrorizado
com o ritmo violento do sangue, o ritmo violento do jazz.
O branco empalideceu ante este novo canto.
que carrega tochas purpúreas na escuridão da noite.
Chegou a alvorada, irmão , a alvorada! Olha nossos rostos
Uma nova manhã desponta na nossa velha África.
Só nossa será a terra, a água, os rios poderosos ,
que o pobre negro entregou durante mil anos.
E as resplandecentes luzes do sol brilharão de novo para nós.
secarão as lágrimas em teus olhos e as cusparadas de tua cara.
Enquanto rompes tuas cadeias, os grilhões pesados,
os tempos malvados e cruéis irão para não voltar mais.
Um Congo livre e bravo surgirá da alma negra.
Um Congo livre e bravo. O florescer negro, a semente negra!


                                     Patrice Lumumba

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