sábado, 5 de outubro de 2013

O artista militante sofre com a censura econômica

Em meio as menções midiáticas aos 25 anos da Constituição de 1988, não podemos deixar de refletir aqui sobre a situação das artes no Brasil, e em particular dos artistas militantes de esquerda. Após o país respirar com o fim do regime militar(1964-85), a Constituição revelava um contexto favorável para a criação artística. Está na Constituição que " É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística ". Apesar da arte não ter que pedir permissão ou ter o consentimento do Estado para existir, isto não deixou de representar um certo alívio. Entretanto, seria este o fim da censura no Brasil? A arte possui uma situação confortável no modo de produção capitalista? De que arte estamos falando? Logicamente a democracia burguesa é relativamente melhor que a ditadura burguesa: é bom sair á luz do dia sabendo que(em tese) ninguém pode ir em cana por se expressar por meio da criação. Entretanto, quando refletimos sobre as condições concretas de produção artística, fica evidente o tamanho da gaiola: embora menos estreita do que em períodos ditatoriais, ela existe e revela do lado de fora os vigilantes da cultura. A burguesia sabe o quanto o artista é perigoso, pois seu habitat " natural " é a transgressão, a violação dos tabus; criar, de fato, equivale extrapolar, decolar e não aceitar um jogo social, em que a arte seria apenas peça integrante do sistema.
  O que de fato determina a existência da gaiola é a própria sociedade capitalista, cuja as formas de controle e repressão ultrapassam as " boas intenções " perante a ideia da liberdade de expressão(esta em si, uma expressão de efeito formal, diante da alienação e da exploração do trabalho que acabam por obstruir sua radicalização no cotidiano). Alertava o bom e velho Brecht sobre os perigos da censura econômica; e é exatamente esta que impede hoje uma subversão generalizada que somente a arte pode garantir, afinal o termômetro para o avanço de qualquer mudança no campo político é medido pela mobilização da sensibilidade, da percepção. Este tipo de censura consiste em permitir que somente os artistas vinculados ao poder econômico possam viver do oficio de " artista ". É também a censura econômica que intimida muitas vezes o artista a estabelecer uma crítica objetiva, independente e necessariamente violenta contra grupos ligados á classe dominante(os processos e as batalhas judiciais, envoltas em questões morais e de direitos autorais, muitas vezes fazem do artista um refém sujeito ás punições financeiras). A censura econômica gera em última análise uma cultura policialesca.
Se a sociedade de classes pressupõe uma cultura dominante, então os espaços são em grande parte ocupados por manifestações artísticas comprometidas com a ideologia da classe dominante. Para a arte ser realmente livre e solta, não podemos desliga-la das suas condições produtivas: é muito superficial achar que a liberdade em arte passa apenas pela escolha do tema, pela elaboração formal. Logicamente, se os fascistas(declarados ou não) pudessem, eles arrebentavam todos os artistas contestadores na porrada, mas esta é usada somente quando ameaçamos atravessar as grades da gaiola. Para se combater o censor oculto pela lógica do capital, devemos fazer da experiência estética não apenas um direito á expressão, mas uma luta pelo controle dos meios que produzem arte.
 Não negamos as conquistas históricas para a situação das artes após 1988. Mas para que possamos avançar precisamos, como já disse Godard, criar uma guerra de guerrilha artística no campo da cultura. Isto pode soar " velho ", mas é somente na luta contra a cultura dominante e não na condição submissa ao incentivo econômico(estatal ou privado), que poderemos de fato democratizar a criação artística. É claro que o artista precisa sobreviver financeiramente, mas um esforço paralelo de militância deve ser realizado: afinal de contas, o artista revolucionário é antes um trabalhador da cultura, ao lado de todos os demais trabalhadores. Perante a espionagem internacional dos gringos, o fortalecimento do conservadorismo religioso e a ofensiva alienante do ensino reacionário e da cultura de massa,  temos uma longa batalha pela frente.


                           Conselho Editorial Lanterna
 

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