Há alguns anos atrás, quando algum cineasta ou escritor optava pela estética do realismo, uma busca política se manifestava: era uma tentativa do artista problematizar e expor sem floreios as contradições sociais de uma determinada época. Já hoje em dia isto não condiz com o significado político de muitos filmes, que mesmo adotando a estética realista estão impregnados de cinismo, amargura e pessimismo perante as relações humanas. É só observar alguns títulos da nova safra do cinema brasileiro, que mesmo fugindo das bobagens mais previsíveis e mesmo sendo sérios, estão contaminados por ideologias desoladoras.
Penso que mesmo com toda aridez e objetividade do realismo, existe atrás das intenções do cineasta verdadeiramente consciente do seu papel intelectual, uma vontade de abrir os olhos do espectador ao representar as coisas do mundo sem idealismo. Vários cineastas brasileiros deveriam assistir menos filmes hollywoodianos e procurar no Neo-realismo italiano, por exemplo, uma maneira de expor os fatos sociais não enquanto parte de um imutável pesadelo mas na chave das suas possibilidades históricas: denunciando para o proletariado a miséria que lhe foi imposta, reforça-se o seu papel político revolucionário. O Neo-realismo enquanto movimento cultural que durante os anos quarenta mandou ás favas a arte fascista, obteve sua verdade revolucionária no cinema. A segunda metade daquela década trouxe em mestres realistas como Luchino Visconti, Roberto Rosselini e Vittorio de Sica, uma transformação radical da produção, da fotografia e do próprio ato de assistir filmes.
Utilizando cenários " naturais ", o cinema redescobriu as ruas e encontrou o povo italiano arrasado pela imposição política fascista que trouxe a guerra. Precisamos nos lembrar da coragem de Rosselini no marco cinematográfico neo-realista Roma, cidade aberta, filme com o qual a brutalidade do fascismo é denunciada para o público italiano. Deixando de lado o glamour da imagem os neo-realistas italianos colocavam sua lente endurecida sobre os dramas econômicos do proletariado. Expressões cinematográficas exemplares disso encontram-se por exemplo em Rooco e seus irmãos, de Visconti, e Ladrões de Bicicleta, de Vitorio de Sica. Dá pra imaginar o impacto(ainda atual) destes filmes sobre o proletariado italiano: no primeiro, uma mãe e seus filhos trabalhadores chegam á cidade de Milão e tem suas vidas submetidas á desumanidade da metrópole. Já no segundo filme, um trabalhador que tem a bicicleta do seu emprego roubada, busca com seu pequeno filho pelo objeto roubado numa sociedade aonde o roubo está ligado ao desespero e á miséria.
Lukács está certíssimo quando afirma que a obra de arte válida para os artistas socialistas, reflete a sociedade, sendo o seu conteúdo fonte de conhecimento objetivo sobre a realidade. Isto tudo é comprovado com o cinema neo-realista italiano. É um cinema político que atinge corações e mentes, sendo provável que o espectador de um dos seus filmes possa, após a exibição, sindicalizar-se, filiar-se á um partido de esquerda ou ainda decidir tomar o exemplo e fazer cinema político(por que não?).
Lúcia Gravas
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