Autonomia e compromisso não são necessariamente dois termos opostos no combate literário. Se a opção política pela classe operária não é gesto sentimental de caridade, mas a constatação histórica de que somente o proletariado apresenta-se enquanto força histórica capaz de colocar fim á sociedade de classes e proporcionar a transição para o socialismo, então o compromisso político requer autonomia estética para novas experiências culturais: é a autonomia, a liberdade que podem permitir o desenvolvimento da pesquisa formal e estilística, que em nada tem a ver com grito de torcida. No campo específico da literatura, de nada adianta a solidariedade espiritual com a pobreza econômica se as técnicas literárias não forem localizadas dentro das relações de produção. Se o leitor lembrou-se aqui de Walter Benjamin, ele acertou em cheio: as condições técnicas de produção literária inseparáveis da forma literária, precisam revelar relações de produção que não abasteçam o aparelho capitalista.
Não faltam na pequena burguesia esquerdista, boas almas interessadas em escrever sobre a fome e os dramas sociais. Mas como diferenciar na orientação literária o humanismo burguês do marxismo? Por maior que seja o virtuosismo de um romancista, de um contista ou de um poeta, tudo é infrutífero se o meio de produção utilizado por ele é controlado pela burguesia e gera tão somente leitores de uma classe média radical. Aliás, tratando-se de uma possível literatura proletária(expressão polêmica e recheada de maus entendidos, já abordados por nós aqui neste blog), hoje ela é produzida nas periferias por trabalhadores. Somente estes, quando compenetrados na sua escrita, conseguem exprimir para as suas comunidades o olhar literário do trabalhador. É chover no molhado quando alguém vocifera que deve-se acabar com o " subjetivismo " do escritor e do artista, fazendo da obra literária/artística um libelo de propaganda. Além de não entrar na pele do problema literário, além de insistir numa análise idealista que só se preocupa com o conteúdo político e não com as relações de produção, agitação e propaganda enquanto resoluções afoitas e sem dimensão histórica concreta, não passam de um refrigerante que a gente agita, agita, e logo depois se esparrama com todo o gás, restando bolinhas literárias no ar e só um restinho de poesia na garrafa.
É sempre bom recorrermos aos apelos de Lenin e Trotski na Ex-URSS, pois ao insistirem que uma nova cultura só poderia nascer quando o proletariado assimilasse as heranças artísticas e literárias do passado, eles tocam no ponto fundamental para o desenvolvimento da literatura: Educação. Não se trata de colocar os trabalhadores na escola e esperar em décadas uma nova literatura revolucionária. Paralelamente ao estudo da História da literatura(inclusive das técnicas modernas, de vanguarda) escritores revolucionários oriundos tanto da classe trabalhadora quanto da classe média, devem pesquisar juntos novas formas dentro de meios de produção culturais que façam da literatura um dado cotidiano na vida das massas. Um poema vanguardista(por exemplo), mesmo sem tratar de fábricas ou favelas, pode ser extremamente útil para um poeta operário: as técnicas de vanguarda podem ampliar o entendimento de mundo do autor popular, fornecendo-lhe novas formas de expressão. Assim sendo, mais do que literatura proletária devemos nos preocupar com a literatura nas mãos do proletariado.
Os Independentes
Nenhum comentário:
Postar um comentário