segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Rock, o prazer que contesta:

Nunca entendi porque as manifestações de arte politizada(inclusive no âmbito musical) precisam ser chatas, sisudas, herméticas, lentas ou assexuadas. O terreno estético é a zona do prazer sensível, da energia erótica que mesmo sublimada, mesmo sendo cultura, transgride a ordem econômica baseada no desprazer do trabalho alienado. Sabemos bem que a burguesia tem uma rígida vigilância sobre o prazer, nem que para isso ela tenha que fabrica-lo dentro dos parâmetros da hipocrisia e da perversão controlável. A música no século XX quebrou a espinha dorsal das estéticas clássicas, eruditas, que exprimiam o gosto da classe dominante. A cultura de massa, apesar de ser cúmplice do capital, trouxe os gostos " selvagens " da música popular; gêneros musicais como o jazz, o samba, o blues e principalmente o bom e velho rock 'n ' roll infestaram os ouvidos burgueses com sons que batem diretamente no corpo, na sexualidade reprimida. Hoje em dia a indústria sabe muito bem como evitar o descontrole musical e a transgressão dos comportamentos, por meio de uma cooptação serial de sub-culturas musicais(que a exemplo do rock, já foram rebeldes) e fabricando de improviso novos músicos, que mesmo demonstrando ou não " competência técnica ", não querem questionar nada. 
  O rock sempre deu um nó na cabeça das esquerdas, inclusive no Brasil. Se os soviéticos achavam que Elvis Presley era pirado e se os discos de rock de várias bandas eram traficados no bloco socialista durante a guerra fria, quem poderia negar que o rock além de assustar a burocracia " socialista ", preocupou ainda mais com seu lastro contracultural as burguesias do ocidente?  Afim de denunciar aqui o chamado rock neoconservador(uma contradição de termos, diga-se de passagem) que hoje faz ninho nos jovens ouvidos despolitizados, precisamos sempre ter em mente os exemplos históricos de transgressão dentro do rock. Não me ocorre exemplo mais preciso que os Rolling Stones, afinal como Pete Townshend, líder do The Who, disse certa vez, " foram os Stones que transformaram o rock em algo socialmente perigoso ". Além de não suavizar nem um pouco o blues, a banda inglesa entre os anos sessenta e setenta, exprimia toda insatisfação que qualquer adolescente do planeta possuía : a explosão da energia sexual, a irreverência do lado andrógeno, a embriaguez em público, o mal humor ... Qualquer pessoa de esquerda entre os anos de 1965-69, poderia perceber que os Stones não podiam ser os queridinhos da mídia, porque para boa parte da juventude proletária da época, as músicas da banda mostravam a insatisfação diante do trabalho, da vida sexual e do caráter ridículo do consumismo.
 Se os Stones, assim como outras grandes bandas de rock, tornaram-se milionários, isto revela a contradição essencial das artes na sociedade contemporânea, pois fora do socialismo e dentro do coração do capitalismo ou o artista participa do sistema ou se marginaliza. Os Stones e outros artistas da sua geração(inclusive no Brasil) optaram pela primeira escolha. Mas essa mesma escolha enterra definitivamente as formas de contestação que também são prazer? Em 1979 Mick Jagger, aquela altura não apenas um rockeiro mas também um homem de negócios, tentava convencer em vão o governo socialista chinês para uma turnê dos Stones, argumentando que a banda era " a campeã entre o proletariado inglês ". Curiosamente, cinco anos antes, o governo militar brasileiro também negava uma turnê dos Stones alegando que eles eram " mal exemplo para a juventude brasileira ". Pois bem, ainda que o proletariado inglês em 1979 estivesse mais interessado no punk rock do The Clash no que na banda de Jagger e Richards, é interessante como o rock incomodava o poder estabelecido como um todo: seja a opinião pública inglesa ou norte americana, seja um governo "socialista " ou ainda uma ditadura militar anti-comunista! 
   Hoje em dia o rock pode assustar burgueses e burocratas? Embora tenha ficado mais difícil chocar uma sociedade que em grande parte absorve as formas de contestação, procurando neutralizar a rebeldia, o prazer e o caráter violentamente sensual da música podem incomodar. Por que isto não poderia ser feito ainda com guitarra, baixo e bateria? Os neoconservadores precisam parar de fingir e voltar a ouvir suas musiquinhas inofensivas de sempre. Já os revolucionários sabem que barulho e prazer ajudam a encher o saco dos capitalistas.


                                                     Tupinik

Nenhum comentário:

Postar um comentário