quarta-feira, 24 de setembro de 2014

A dimensão literária:

É compreensível que o militante de esquerda cerque-se de uma metodologia científica, tal como o marxismo oferece, para interpretar a realidade política. Tudo isto é muito útil para a orientação da prática militante e da reflexão teórica. Mas a ficção teria algo a dizer para este militante? Sendo a ficção, especificamente em sua dimensão literária, um campo de invenção, seria ela inimiga da reflexão "objetiva" sobre os fatos históricos? Suponha-se que o militante aprecie a literatura enquanto trampolim para o exame das realidades sociais, então a criação literária seria mero atalho, ou percurso invertido, para o que as ciências humanas já fazem?
 A literatura não é muleta mas uma área em que o problema político surge de maneira distinta a da ciência. A prosa ou o poema criam uma dimensão que tende a se chocar com a própria realidade, ainda que a intenção do escritor seja a mais realista possível. O objeto literário não é a realidade, mas a representação dela. Esta condição traz um poder de intervenção sobre o real, no qual a sensibilidade do leitor é modificada pelo contraste entre o real e a ficção. Ou seja, a literatura não é uma desculpa estilística para batermos papo sobre política. A literatura é um gesto político no qual o escritor dirige-se a um leitor educado em uma determinada sociedade. Se este escritor possui consciência de classe ou se exprime pela ficção um protesto contra as determinações de um dado modo de produção, então estamos falando de um revolucionário.


                                                                                   Lúcia Gravas 

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