segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Aquele que escreve sobre a revolta:

Quando opta-se por expor através da palavra escrita as relações humanas, o escritor revela em suas escolhas estéticas uma posição ética. Inseparável de sua própria posição política, sua visão acerca dos conflitos pode ser apaziguadora, nostálgica, evasiva ou revoltada. É dentro deste último aspecto, o da revolta diante das instituições e da organização social como um todo, que as mais diversas situações que um texto abarca apontam para mudanças. Não importa se estamos a falar de situações " pessoais " ou da esfera pública: na ficção literária a costura dos personagens é o movimento que flagra em todas as suas dimensões as próprias determinações da História.O mesmo vale para a poesia.
 Já fui recriminado inúmeras vezes por valorizar em literatura somente aquelas obras que falam de seres em conflito com um tipo de ordem social. Mas diferentemente do que muitos supoem, não sou contra o relato pessoal, contra a apresentação " desinteressada " dos diferentes universos culturais ou das memórias da infância. Penso que tudo isto envolve importantes materiais para a narrativa ou para o poema. Entretanto, o que não posso admitir é que estes assuntos sejam utilizados para isolar a obra literária das graves questões sociais. Tanto faz se o autor opta por falar a linguagem do inconsciente ou se decide mergulhar nas suas lembranças pessoais. A sua escrita vem de algum lugar, pois ela está(como diria Sartre) em situação. Pode-se fugir como um coelho das responsabilidades políticas e se entorpecer no próprio " eu "; mas se o " eu é um outro ", como afirmara Rimbaud,   que ideia podemos ter do humano? Alguém entregue as mais ordinárias convenções sociais? Um indivíduo que usa a escrita apenas para urinar e demarcar seu território pessoal? Um animador do mercado editorial que escreve sobre o que agrada a predatória burguesia brasileira? Não importa o tema, o escritor que não se revolta é complacente com a ordem capitalista.


                                                                                                    Lenito

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