sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Um teatro que arranque o espectador da cadeira:

Fico particularmente horrorizada com as tentativas de subordinar a arte teatral ao texto com mensagens políticas mastigadas. Ué, se a experiência cênica não se diferencia da pura propaganda, seria mais fácil largar mão do teatro e dirigir políticos e figurantes nas atuais campanhas partidárias. Enquanto acontecimento, o teatro pode combater a ordem capitalista de diferentes maneiras. Acho moderníssima a atitude de gente como Meyerhold e Piscator, baseada no conflito entre classes sociais que é posto numa apreensão que reformula a linguagem teatral. Mas ainda assim, acho que fica faltando algo mais, algo que possa chegar até o fundo da cabeça do espectador, no fundo do seu eu, lá na camada mais antiga da mente, denominada por Freud de id.
 Longe de mim querer reduzir as coisas no plano do irracionalismo, mas o racionalismo também não ajuda em nada. Creio que o teatro possa ajudar a arrancar não apenas as máscaras da burguesia, mas o figurino que ela impõe para todos nós; e não falo somente de roupa mas de um tipo de corpo, de um corpo resultante de uma educação repressiva que leva a uma experiência corpórea que dissocia espírito e matéria. Portanto mergulhar no inconsciente do espectador também deve ser entendido enquanto ato militante libertário. Mas falar objetivamente dos problemas políticos também não significa automaticamente caretice. Entre o cuecão stalinista que prega o proselitismo e o artista de classe média que só quer amalucar a linguagem teatral porque não assume uma clara posição política, existem alternativas.
 Não estamos mais nos anos setenta, quando optava-se ou por Brecht ou por Artaud. Quem realmente leu estes autores sabe que ambos são fundamentais para a criação teatral. Chega de polarizações: o fato é que o espectador passivo aumenta na sociedade contemporânea; sobretudo quando o teatro está infestado pelo que de pior pode existir em termos de indústria cultural. Temos que chegar no fundo do espectador, liberar o seu inconsciente, mas não para adapta-lo ao mundo estabelecido ou faze-lo sair pela tangente pós-moderna. Ou seja, a imaginação livre e a análise dialética trabalham, em suas diferenças estéticas,  no mesmo palco para um objetivo comum:  nocautear a cultura da classe dominante.   


                                                                                Marta Dinamite


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